FLOR CULTA E BELA
Por Marcilio Godoi
"Minh'alma, de sonhar-te, anda perdida.
Meus olhos andam cegos de te ver!
Não és sequer razão do meu viver
Pois que tu és já toda a minha vida"
(Florbela Espanca)
A vida de Florbela Espanca é roteiro que seria recusado por produtores de cinema sob a alegação de implausibilidade. Aqui o enredo em uma linha: pai, introdutor do cinematógrafo em Portugal, casa-se, mas tem filhos com a criada, em função de doença da mãe; bela filha cresce com temperamento artístico e é tratada como doente de nervos, embora seja das primeiras mulheres a ingressar na Universidade de Lisboa; casa-se três vezes, tem dois abortos, é incompreendida no meio em que vive; certo dia, o único irmão, piloto, joga seu avião contra o rio Tejo; tradutora e poeta de lirismo dramático, suicida-se com dois frascos de Veronal.
Melhor simplesmente dizer que Florbela Espanca expressou o amor feminino em sonetos clássicos, não se rendendo aos experimentalismos do modernismo português, mas estava de certo modo à frente dele, em densidade psicológica. Escreveu intensamente, até que viessem as últimas palavras de seu diário, justificando o ato por não haver gestos novos nem palavras novas.