COMPLEMENTO OU ADJUNTO?
Uma das maiores dificuldades dos estudantes de sintaxe é a distinção entre ADJUNTO ADNOMINAL e COMPLEMENTO NOMINAL. Em princípio, o adjunto adnominal, formado pela preposição de + nome, vem sempre depois de um substantivo e indica posse (livro de Pedro), matéria (cadeira de aço) ou qualidade (menino de ouro). O complemento nominal não oferece problema quando vem depois de adjetivo ( fiel à lei) ou de advérbio (independentemente da vontade).
O problema é quando um dos termos, o complemento nominal ou o adjunto, vem depois de substantivo. Se este é abstrato, tem a força transitiva, e aí teremos um complemento nominal: a invasão de terras (ato de invadir), criação de galinhas (ato de criar). Se o nome for concreto, teremos adjunto adnominal: “A plantação de trigo foi destruída pelo incêndio”(plantação de trigo = trigal). Mas em “A plantação de trigo cria divisas para o país”, a plantação é o ato de cultivar trigo, e “ de trigo” é complemento nominal.
SUBSTITUIÇÃO
A ideia é simples: se o nome fosse verbo, o adjunto adnominal seria sujeito (mas indicando posse, matéria ou qualidade), e o complemento nominal seria o objeto. Assim, se digo “A invenção de Santos Dumont diminuiu as distâncias”, não estou dizendo que Santos Dumont foi inventado, mas que ele inventou (sujeito); a invenção pertence a ele (posse). Mas, se digo “A invenção de palavras caracteriza o estilo de Dias Gomes”, estou dizendo que inventar palavras caracteriza o estilo de Dias Gomes (invenção é nome com força transitiva;não há ideia de posse: as palavras não possuem invenção, nem invenção possui palavras).
Como o adjunto adnominal exerce função adjetiva, às vezes é conveniente tentar substituir a expressão suspeita por adjetivo; se não, teremos um complemento. Assim, em “risco de morte”, “de morte” equivale ao adjetivo “mortal”. Temos aí um adjunto adnominal. Mas, em “risco de vida”, não posso dizer risco “vital”; temos aí um complemento nominal.
“Risco de vida” equivale a arriscar a vida. “Risco” é aí um nome com força transitiva.
Uma expressão pode ser adjunto ou complemento, a depender do contexto. Em “O amor de Deus pelos homens é grande", “de Deus” é adjunto adnominal (Deus é que ama, o amor é Dele, posse).Mas, em “O amor de Deus torna os homens piedoso), “de Deus” é complemento nominal. (Deus é objeto do amor; os homens é que têm o amor, não Deus). Em francês, há uma diferença sutil entre caísse d’eu (caixa-d’água, em uso, com água dentro) e caísse à eau (caixa de água, vazia). Em “caixa de vidro”, se o vidro indica a matéria de que a caixa é feita (caixa vítrea), temos um adjunto adnominal; mas se indica o conteúdo da caixa, então “de vidro” é complemento nominal. Da mesma forma, em “Comprei duas xícaras de café”, a expressão “de café” classifica as xícaras, determinando-as: adjunto adnominal. Mas, em “Bebi duas xícaras de café”, “de café indica conteúdo: complemento nominal.
Uma expressão como “pai de família” não pode ser substituída por “pai familiar”. Temos aí complemento nominal. Confere-se “pai de família” com "chefe de família" (em que “chefe” tem força transitiva: chefiar a família): “de família” é complemento nominal.
RESUMO
Em síntese: se indicar posse, matéria ou qualidade (ou agente), o termo é adjunto adnominal. Se completar o sentido transitivo do nome, o termo é complemento nominal. Atente-se para o fato de que o pronome relativo “cujo” é sempre adjunto adnominal e nunca complemento nominal. Numa frase como “O prefeito fez um discurso na ponte para cuja inauguração até o presidente foi convidado”, o pronome “cuja” é usado inadequadamente como complemento nominal de “inauguração”. De preferência: “O prefeito fez um discurso na ponte para a inauguração da qual até o presidente foi convidado”. “Cujo” é usado sempre com ideia de posse, real ou virtual. No exemplo, nem a ponte pertence à inauguração, nem a inauguração pertence à ponte. Mas o melhor uso de “cujo” é: “O rapaz com cujo irmão falei é estudioso”; “O lenço em uma de cujas pontas estavam bordadas as tuas iniciais era azul” e “Ruiu a ponte cujos arcos eram altos”.
JOSÉ AUGUSTO CARVALHO – mestre em Linguística pela UNICAMP e doutor em Letras pela USP
Revista Língua Portuguesa. Ano 3. Nº42.abr.2009.
Uma das maiores dificuldades dos estudantes de sintaxe é a distinção entre ADJUNTO ADNOMINAL e COMPLEMENTO NOMINAL. Em princípio, o adjunto adnominal, formado pela preposição de + nome, vem sempre depois de um substantivo e indica posse (livro de Pedro), matéria (cadeira de aço) ou qualidade (menino de ouro). O complemento nominal não oferece problema quando vem depois de adjetivo ( fiel à lei) ou de advérbio (independentemente da vontade).
O problema é quando um dos termos, o complemento nominal ou o adjunto, vem depois de substantivo. Se este é abstrato, tem a força transitiva, e aí teremos um complemento nominal: a invasão de terras (ato de invadir), criação de galinhas (ato de criar). Se o nome for concreto, teremos adjunto adnominal: “A plantação de trigo foi destruída pelo incêndio”(plantação de trigo = trigal). Mas em “A plantação de trigo cria divisas para o país”, a plantação é o ato de cultivar trigo, e “ de trigo” é complemento nominal.
SUBSTITUIÇÃO
A ideia é simples: se o nome fosse verbo, o adjunto adnominal seria sujeito (mas indicando posse, matéria ou qualidade), e o complemento nominal seria o objeto. Assim, se digo “A invenção de Santos Dumont diminuiu as distâncias”, não estou dizendo que Santos Dumont foi inventado, mas que ele inventou (sujeito); a invenção pertence a ele (posse). Mas, se digo “A invenção de palavras caracteriza o estilo de Dias Gomes”, estou dizendo que inventar palavras caracteriza o estilo de Dias Gomes (invenção é nome com força transitiva;não há ideia de posse: as palavras não possuem invenção, nem invenção possui palavras).
Como o adjunto adnominal exerce função adjetiva, às vezes é conveniente tentar substituir a expressão suspeita por adjetivo; se não, teremos um complemento. Assim, em “risco de morte”, “de morte” equivale ao adjetivo “mortal”. Temos aí um adjunto adnominal. Mas, em “risco de vida”, não posso dizer risco “vital”; temos aí um complemento nominal.
“Risco de vida” equivale a arriscar a vida. “Risco” é aí um nome com força transitiva.
Uma expressão pode ser adjunto ou complemento, a depender do contexto. Em “O amor de Deus pelos homens é grande", “de Deus” é adjunto adnominal (Deus é que ama, o amor é Dele, posse).Mas, em “O amor de Deus torna os homens piedoso), “de Deus” é complemento nominal. (Deus é objeto do amor; os homens é que têm o amor, não Deus). Em francês, há uma diferença sutil entre caísse d’eu (caixa-d’água, em uso, com água dentro) e caísse à eau (caixa de água, vazia). Em “caixa de vidro”, se o vidro indica a matéria de que a caixa é feita (caixa vítrea), temos um adjunto adnominal; mas se indica o conteúdo da caixa, então “de vidro” é complemento nominal. Da mesma forma, em “Comprei duas xícaras de café”, a expressão “de café” classifica as xícaras, determinando-as: adjunto adnominal. Mas, em “Bebi duas xícaras de café”, “de café indica conteúdo: complemento nominal.
Uma expressão como “pai de família” não pode ser substituída por “pai familiar”. Temos aí complemento nominal. Confere-se “pai de família” com "chefe de família" (em que “chefe” tem força transitiva: chefiar a família): “de família” é complemento nominal.
RESUMO
Em síntese: se indicar posse, matéria ou qualidade (ou agente), o termo é adjunto adnominal. Se completar o sentido transitivo do nome, o termo é complemento nominal. Atente-se para o fato de que o pronome relativo “cujo” é sempre adjunto adnominal e nunca complemento nominal. Numa frase como “O prefeito fez um discurso na ponte para cuja inauguração até o presidente foi convidado”, o pronome “cuja” é usado inadequadamente como complemento nominal de “inauguração”. De preferência: “O prefeito fez um discurso na ponte para a inauguração da qual até o presidente foi convidado”. “Cujo” é usado sempre com ideia de posse, real ou virtual. No exemplo, nem a ponte pertence à inauguração, nem a inauguração pertence à ponte. Mas o melhor uso de “cujo” é: “O rapaz com cujo irmão falei é estudioso”; “O lenço em uma de cujas pontas estavam bordadas as tuas iniciais era azul” e “Ruiu a ponte cujos arcos eram altos”.
JOSÉ AUGUSTO CARVALHO – mestre em Linguística pela UNICAMP e doutor em Letras pela USP
Revista Língua Portuguesa. Ano 3. Nº42.abr.2009.
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